Para André Mascarenhas, Professor da FEI, a mudança no cenário da educação corporativa é complexa e não se resolverá em uma geração
No artigo O que é o apagão da mão-de-obra e como se manifesta?, tratei do tão falado apagão da mão-de-obra como um efeito colateral da transformação da sociedade brasileira.Este fenômeno se manifestaria de forma diferente nos setores, com impactos variados nas empresas. De forma geral, este termo evidencia as dificuldades que a sociedade vem enfrentando com a oferta limitada de profissionais.
Faltam ofertas dos mais diversos níveis de capacitação para suprir as necessidades dos setores econômicos em transformação. Isto também reflete a má qualidade de nossa educação em seus vários níveis. O fenômeno do apagão da mão-de-obra impõe desafios imensos ao governo, às empresas e à sociedade civil.
Ao enfrentamento imediato destes desafios, é verdade que cada caso é um caso. Diferenças entre regiões geográficas, setores econômicos, velocidades de crescimento e outros fatores tornam as respostas das empresas diferentes às dificuldades com a contratação e retenção de profissionais.
De fato, há uma série de desafios de curto prazo, com oportunidades batendo às portas das empresas e a necessidade consequente de mão-de-obra. Esta necessidade, faz a dor de cabeça dos profissionais de RH e consultorias em busca de pessoal com a qualificação necessária. Estes desafios pertencem ao domínio do “apagar incêndios” do dia-a-dia da administração.
Gostaria de discutir aqui outra ordem de desafios, os de longo prazo. As perspectivas de crescimento de nossa economia são boas. Em alguns setores, crescemos a taxas chinesas. O mercado de trabalho se expande e bate recordes.
Os investimentos diretos sinalizam uma década de oportunidades. Contudo, nossa educação não evolui no mesmo ritmo. A inovação nos métodos de ensino é lenta, a carreira do professor ainda é desvalorizada, a abrangência do ensino superior cresceu bastante, mas ainda insuficiente, e a qualidade ainda deve evoluir muito.
Trata-se de uma mudança complexa, e que não se realizará numa geração somente. Para piorar, não se prioriza a educação como se deveria, pois não há estímulo político suficiente para investimentos massivos que acelerem uma transformação complexa e demorada. Afinal, o ciclo da política no Brasil dura quatro anos.
De fato, este cenário não é favorável às pessoas nem às empresas. Às pessoas, porque não têm à sua disposição oportunidades educacionais adequadas para aproveitarem plenamente as oportunidades da bonança.
Distorção que é, o mercado educacional perpetua o mito do diploma, como se este fosse garantia de sucesso profissional, sendo que o buraco parece estar bem mais embaixo: o ensino médio é um gargalo, e os profissionais têm deficiências em competências básicas.
Por outro lado, as empresas vêem-se num ambiente de competição por aqueles mais bem preparados e que, em alguns setores, pode implicar altas taxas de rotatividade e indisponibilidade.
Por todos estes motivos, o mercado de trabalho parece de fato hostil às empresas, que devem minimizar seus problemas, tornando-se mais atraentes aos seus funcionários e potenciais funcionários.
O argumento que proponho aqui é que, além das soluções implantadas pelos níveis de governo, sociedade civil e também pelo setor privado, as empresas devem reconhecer a necessidade de construírem modelos atraentes de gestão de pessoas. E estes modelos precisam ser capazes de diferenciar a organização de sua concorrente por mão-de-obra, aumentando sua capacidade de atrair e reter talentos.
Neste cenário hostil à contratação e retenção, talentos são escassos, e as organizações devem reconhecer a complexidade inerente ao desafio de mantê-los, envolvidos e motivados, apesar das propostas que recebem de concorrentes.
Este argumento é capaz de dar novo destaque à função de gestão de pessoas, que perpassa todo o cotidiano da organização, e não somente o RH. Este cenário é mais favorável à tão falada (e desacreditada) valorização do ser humano nas organizações.
São muitas as implicações, incluindo mudanças de mentalidade. Um exemplo claro é o pensamento muito comum nas empresas, nas quais se resiste ao investimento em treinamento e desenvolvimento naqueles funcionários que mais provavelmente deixarão a empresa. Parece um dilema, mas não é.
É verdade que muitos deixarão a empresa, e que a conta pode ficar cara. Contudo, um sistema de educação corporativa deve ser um componente importantíssimo a uma estratégia de gestão de pessoas capaz de aumentar a atratividade da empresa no mercado de trabalho.
No fim das contas, a rotatividade existirá num ambiente de apagão, mas as empresas percebidas como organizações qualificantes serão aquelas mais aptas a atrair e reter os melhores.
André Ofenhejm Mascarenhas (Professor dos Cursos de Mestrado e Doutorado em Administração do Centro Universitário da FEI)
Fonte: Portal HSM
23/08/2011
23/08/2011
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